A Failed Entertainment #5: Sapatos: fica-se; chinelos: sai-se
A Failed Entertainment é um projecto curatorial de Ana Anacleto para o espaço De Porta a Porta – Travessa da Ermida, desenvolvido em colaboração com a MEEL Press, e que se centra na apresentação de múltiplos de gravura.
O nome do projecto cita o título provisório que David Foster Wallace atribuiu ao seu romance maior, datado de 1996 (e cujo título oficial é The Infinite Jest). Usando o espaço de uma porta (que é também uma montra), na Travessa do Marta Pinto, em Belém, o projecto apresenta à vez, uma única obra de um/a artista convidado/a a produzir especificamente para o contexto proposto.
Socorrendo-se da natural desaceleração e demora implicada nos processos tradicionais de produção da gravura e na complexidade da construção dos projectos assente numa articulação cuidada e intensa entre curadora e artista, o projecto A Failed Entertainment procura posicionar-se como que no reverso da actualidade, nessa dobra do real que permite contrariar a tendência de um mundo dominado pelo digital e por uma perseguição obsessiva do entretenimento.
Interessa-nos, por isso, a assumpção deceptiva do fracasso, a frustração das expectativas, o momento falhado, a desconstrução das narrativas visuais, a negação da percepção imediatista, permitindo a definição de um território de fruição que se posiciona espacial e temporalmente distante do cánon.
O quinto momento do programa apresenta uma obra concebida por Daniel Fernandes, desenvolvida e integralmente produzida no atelier da MEEL Press.
Sob o título Sapatos: fica-se; Chinelos: sai-se, é apresentada uma gravura que sinaliza não um resultado, mas um processo – como é aliás habitual na obra deste artista. Um processo de execução que explora a condição de serialidade inerente à disciplina da gravura, para rapidamente a questionar e subverter.
Partindo de um referente imagético pré-existente, e recorrendo à prática da monotipia, Daniel Fernandes trabalhou aturadamente procurando explorar, durante um determinado período de tempo, inúmeras possibilidades combinatórias que o conduzissem a uma ideia de falência. A esse território onde não só a realização já não é viável como a sua possibilidade é completamente inexistente.
Repetir, repetir, repetir, até esgotar, crendo na vitalidade regeneradora da falha e na performatividade do gesto repetido.
Desta multiplicidade de alternâncias resulta não uma imagem que representa, mas um conjunto de imagens que ‘se’ representam, questionando a sua própria condição e sublinhando a prática da combinatória enquanto mecanismo de esgotamento do possível.
Ana Anacleto