A Failed Entertainment é um projecto curatorial de Ana Anacleto para o espaço De Porta a Porta – Travessa da Ermida, desenvolvido em colaboração com a MEEL Press, e que se centra na apresentação de múltiplos de gravura.
O nome do projecto cita o título provisório que David Foster Wallace atribuiu ao seu romance maior, datado de 1996 (e cujo título oficial é The Infinite Jest). Usando o espaço de uma porta (que é também uma montra), na Travessa do Marta Pinto, em Belém, o projecto apresenta à vez, uma única obra de um/a artista convidado/a a produzir especificamente para o contexto proposto.
Socorrendo-se da natural desaceleração e demora implicada nos processos tradicionais de produção da gravura e na complexidade da construção dos projectos assente numa articulação cuidada e intensa entre curadora e artista, o projecto A Failed Entertainment procura posicionar-se como que no reverso da actualidade, nessa dobra do real que permite contrariar a tendência de um mundo dominado pelo digital e por uma perseguição obsessiva do entretenimento.
Interessa-nos, por isso, a assumpção deceptiva do fracasso, a frustração das expectativas, o momento falhado, a desconstrução das narrativas visuais, a negação da percepção imediatista, permitindo a definição de um território de fruição que se posiciona espacial e temporalmente distante do cánon.
O sexto momento do programa apresenta uma obra concebida por Alice Geirinhas, desenvolvida e integralmente produzida no atelier da MEEL Press.
Em Diotima Alice Geirinhas cruza (como habitualmente no seu trabalho) um conjunto de referências, por forma a produzir uma obra que mais do que ilustrar um pensamento, se apresenta ela própria como uma proposta de pensamento e de reflexão política sobre a interessante questão do apagamento.
Apropria o nome da sacerdotisa ficcionada por Platão no ‘Banquete’, responsável pela educação de Sócrates em relação ao tema do Amor e figura secundarizada na história da Filosofia ocidental, e entrecruza-a, no contexto desta obra, com uma intervenção directa que realiza sobre uma página do jornal Público de 2006 que noticia o segundo referendo ao tema da despenalização do aborto em Portugal.
Usando uma metodologia própria do desenho (o apagamento de formas através de materiais riscadores, que tanto apagam como sublinham) a artista funde a condição habitualmente hierarquizada entre imagem e texto. E explorando a técnica da fotogravura com chine collé, com a reprodução a cor, convoca simultaneamente a atenção do espectador para a presença do gesto afirmativamente político de uma outra artista sua contemporânea – Paula Rego.
A observação da actualidade da vida colectiva e a cuidada análise – muitas vezes irónica – com que relê (redesenhando) determinados momentos históricos, aproximam o seu trabalho do estudo sociológico e permitem-lhe definir um conjunto de ferramentas sócio-políticas de aproximação e relação pessoal com o mundo.
O projecto encontrar-se-á disponível para visita 24h sobre 24h, durante todo o período expositivo anunciado.
Ana Anacleto